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sexta-feira, 9 de abril de 2010

Projeto inovador

Após a oferta de MBA para gestores, UnG lança especialização para docentes visando a melhoria contínua de seu ensino. Educador Marcos Masetto ministra aula inaugural
Portal UnG (08/04/2010) – A qualidade do ensino é condição fundamental para a formação de profissionais capacitados, imbuídos de ética, valores e conhecimentos técnicos que lhes garantirão um espaço no mercado de trabalho.

Não há receita definida para alcançar tal adjetivo. Sabe-se apenas que na mistura não podem faltar ingredientes como infraestrutura e capital humano. A UnG pouco a pouco vem acrescentando outros condimentos. Em 2009, lançou um MBA voltado para a capacitação de gestores. Agora, implanta o curso de pós-graduação lato sensu em “Docência no Ensino Superior” com o intuito de aprimorar o processo ensino-aprendizagem de seus docentes. “Estamos em busca da excelência do ensino”, disse a reitora da UnG, professora Dumara Sameshima. “Investir na qualidade do nosso docente e buscar a disseminação de técnicas e instrumentos diferenciados para estimular o ensino são alguns dos passos”.

As atividades da especialização foram iniciadas na última quarta-feira (07), quando o educador Marcos Masetto ministrou aula inaugural para os mais de 80 professores inscritos, além de alunos do MBA em Gestão em Instituição de Ensino. “Se eu quero um projeto inovador eu preciso que os gestores sejam preparados para uma gestão inovadora; que os docentes sejam organizados para uma docência inovadora; e que haja um trabalho sério com os funcionários para que eles possam se abrir para uma colaboração visando a excelência do projeto inovador”, disse o doutor em Educação em entrevista ao Portal UnG (veja abaixo na íntegra).

Segundo o coordenador do curso, prof. Renato Augusto dos Santos, para os 15 meses de atividades estão previstas discussões em torno dos fundamentos da educação, do planejamento de projetos educacionais, ensino a distância, metodologia científica, entre outros temas. “Nosso objetivo é criar um ambiente para a reflexão da docência no ensino superior e possibilitar a implantação de um processo inovador de ensino na UnG”, explicou Santos.

Na lista de matriculados, estão professores de diversos cursos e com titulação diferenciada. “Temos de mestres a doutores juntos, empenhados na busca pela
qualidade educacional da UnG”, afirmou o coordenador.

A especialização é gratuita para os docentes. As aulas acontecem uma vez por semana.

Mestre e doutor em Educação, Livre-docente pela Faculdade de Educação da Universidade São Paulo (USP) e Professor Titular da PUC-SP e da Universidade Presbiteriana Mackenzie, Marcos Masetto conversou com o Portal UnG após a aula inaugural que ministrou no curso de especialização “Docência no Ensino Superior”, implantado pela Universidade Guarulhos. Veja os principais trechos da conversa.

Portal UnG – Não há uma receita. Entretanto, é possível citar características de um processo ensino-aprendizagem considerado ideal para o ensino superior?

Masetto – A questão fundamental é abrir-se para o que hoje chamamos de “nova cultura da aprendizagem”. Quem trabalha muito com esse conceito é o doutor em Psicologia Juan Ignacio Pozo. Nessa concepção, a aprendizagem é entendida como desenvolvimento total da pessoa humana, ou seja, do pensamento intelectual, das manifestações afetivo-emocionais, competências, habilidades, atitudes e valores. Essa visão de aprendizagem cabe em qualquer instituição educacional, inclusive, e principalmente, no ensino superior. A formação profissional de pessoas exige, na atual conjuntura, amplitude de conhecimento. É preciso oferecer informação; é imprescindível estimular o aluno a pensar, pesquisar, inventar, descobrir, encontrar soluções. Esse aluno precisa aprender a ouvir, absorver e devolver. Essa “nova cultura da aprendizagem” também compreende ensinar ao estudante a importância das relações interpessoais com profissionais da área em que atua, profissionais de outros setores, grupos da população, etc. Como fazer isso? Trabalhando, sobretudo, de maneira interdisciplinar, desenvolvendo projetos que reúna esferas distintas da instituição de ensino. Desenvolver autoestima nesse profissional e discutir com ele a necessidade de pensar as implicações na sociedade de suas decisões também faz parte dessa concepção de ensino.

Portal UnG – Quais as competências exigidas de um professor para que essa nova cultura da aprendizagem se concretize?

Masetto – Mais uma vez, a primeira iniciativa é abrir-se para a compreensão dessa aprendizagem. Segundo: conseguir planejar aulas levando em conta a necessidade do desenvolvimento total do aluno. Para ter êxito nesse processo é necessário, ainda, desenvolver a habilidade de mediação pedagógica. Não basta apenas ser um expert numa matéria e a expor muito bem. É fundamental que o docente seja um planejador de situações de aprendizagem para o aluno.

Portal UnG – Das suas reflexões sobre educação parece emergir a tese de que a prática educativa deve abandonar os modelos fortemente estruturados, em favor de um processo formativo aberto. É possível projetar uma intervenção formativa sem poder determinar desde o início objetivos didáticos e educacionais?

Masetto – Não. São duas coisas distintas. Quando entramos para o trabalho educacional, independentemente do nível, teremos sempre uma intencionalidade com nossas ações. O professor deve ter muito claro suas pretensões em relação às pessoas que ele ensina, portanto, seus objetivos devem estar delineados e serem os grandes orientadores do processo ensino-aprendizagem. Isso estabelecido, aí sim ele pode estruturar o que fazer e alternativas diferenciadas do como fazer.

Portal UnG – A preocupação de uma IES quanto à capacitação de seu corpo docente é um passo importante rumo à implantação de um processo educativo inovador?

Masetto – Sem dúvida. Se eu quero um projeto inovador eu preciso que os gestores sejam preparados para uma gestão inovadora; que os docentes sejam organizados para uma docência inovadora; e que haja um trabalho sério com os funcionários para que eles possam se abrir para uma colaboração visando a excelência do projeto inovador. Há concepções de ensino muito boas, mas que naufragam porque os funcionários não foram envolvidos, assim como, evidentemente, existem projetos que não se concretizaram pela ausência de envolvimento de gestores e docentes. O trabalho precisa ser em conjunto para que o quarto elemento do projeto, o aluno, seja influenciado na mudança de sua cultura, atitude, percepção.

Portal UnG – O que podemos classificar como um processo educativo inovador?

Masetto – Trata-se de um projeto que responda a determinadas necessidades que hoje existem no ensino superior, para as quais outros modelos que aí estão não mais respondem. Não adianta continuar repetindo os mesmos modelos, porque as necessidades e exigências continuam, eles não respondem e o ensino não avança.

Portal UnG – O uso das novas tecnologias da educação tem sido bem aproveitado em prol da melhoria da qualidade do ensino no País?

Masetto – Não. As tecnologias são pouco exploradas. Supõem-se, para a boa utilização delas, que os professores tenham a possibilidade de desenvolver a sua formação e competência para o uso. Entretanto, isso ainda é restrito a pouquíssimas universidades.

Portal UnG – Alguns vestibulares e o Enem já adotam o conceito de avaliação interdisciplinar – apostando que, mais do que ter conhecimentos, é fundamental saber conjugá-los para resolver problemas do dia a dia. No entanto, a maioria das escolas ainda não caminha nessa direção, e trata as disciplinas de forma individual. Como resolver esse problema?

Masetto – O ensino disciplinar ainda predomina nas escolas. A interdisciplinaridade e a multidisciplinaridade, como apresentadas no projeto UnG Comunidades, são raridades. Existem, são vários, mas se olharmos no conjunto, ainda são raros. Isso é preocupante e um contrassenso. Na sociedade contemporânea, o que manda é o conhecimento interdisciplinar. A ausência de processos educacionais com essa base causa prejuízo a todos. O conhecimento perde, o desenvolvimento intelectual perde, o desenvolvimento profissional do aluno perde e sua interação com a sociedade também perde, porque a interação envolve projetos e, esses, envolvem a interdisciplinaridade.
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